quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

O Soluço

Minha mente sempre foi espaçosa para abrigar devaneios. Desde criança eu já era procurado por minhas idéias esdrúxulas. Lembro da vez que "fugi" de casa, encontrei um saco de conchinhas em baixo da ponte do bragueto e fui vender na rua, o motivo disso tudo eu não me recordo, mas devia ser ir pra Disney. Essa cabecinha de Deus sempre foi terreno féritil para o surgimento de grandes soluções, isso dizia minha mãe, mas, na maioria das vezes, grandes problemas também, já essa constatação era da madre batatinha, uma das freiras da escola em que comecei minhas divagações filosóficas de ginásio. 

Quem não esquece minhas loucuras também é a mãe do Nema, meu fiel parceiro de mulequices. E foi exatamente nas lembranças daquele tempo que ela se fiou para procurar minha ajuda na semana passada. Me ligou chorosa clamando por uma idéia daquelas para socorrer o Nema. Disse ela que meu grande amigo de infância havia adquirido uma soluço que perdurava já tinha seis meses. Soluço! Já tinha lido no Guiness Book que um pobre coitado soluçou por cinco anos e de repente parou. Bem, depois de 5 anos soluçando, quando parou assim sem dar aviso, provavelmente o cara achou que ia morrer, o ser humano se acostuma com tudo, mas acho que a mãe do Nema não queria ouvir isso não.

Passei dois dias matutando sem falar com meu camarada, que a essa altura já nem saía mais de casa, sua estima estava tão em baixa que não falava nem no telefone, não ia mais pro trabalho, que é de telemarketing, o que é totalmente compreensível, mas o pior, não conseguia mais se relacionar com ninguém, uma deprê total.

A solução me veio naturalmente, assistindo a um filme de suspense tipo B, dos piores que já vi, um em que um monstro que não aparece ataca New York e mata tooodo mundo. O engraçado é que o filme é recente. O objetivo deveria ser assustar a platéia que só fazia rir. Mas é isso, soluço se cura com susto! Dito e feito, saí do filme e liguei pro Nema.

Quando a gente era criança ele era um carinha bem destemido, brigava na rua, pulava de cachoeira, descia ladeiras incríveis de skate e coisas tais. Ele só atendeu por que não nos faláva-mos há muito tempo e ficou curioso com a ligação. Eu disse logo de cara que sabia da situação e que queria propor-lhe uma visita a um boog jump de um outro amigo nosso dos tempos de terrorismo infantil, pois ele precisava se distrair um pouco, pelo menos para relaxar a sua mãe, que estava muito preocupada.

Em paralelo, liguei pro nosso amigo instrutor de suicídio e expliquei meu plano, ele achou graça mais topou a brincadeira. Lá chegamos e depois de relembrar os tempos pueris fomos ao que interessava. O Nema corajoso foi logo na frente, como estava entre amigos antigos ainda conseguia se sentir a vontade para soluçar com tranquilidade. O instrutor o amarrou ao aparato e lhe disse que se deixasse cair lentamente de costas para o abismo olhando para a gente. Nesse momento, assim que percebemos que não tinha mais como ele voltar, desistir da queda ou se agarrar a qualquer coisa veio o combinado, o instrutor fez uma cara de susto com medo extremo e gritou: - Pelo amor de Deus, Nema, esqueci de amarrar a outra ponta! 

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